terça-feira, 20 de agosto de 2013

A BUSCA DE PEDRO HOMILIANO

          Já na infância Pedro Homiliano parecia-se desencontrado. Na escola, aprendia tudo ao mesmo tempo em  que ia desaprendendo as coisas.
          Os pais não se viam plenamente refletidos nas maneiras e no desenvolvimento do filho e o toleravam resignados, até o dia em que a mãe o encontrou pelado com outros meninos na casa dos fundos, castigando-o e restringindo-lhe os espaços.
          Não foi o melhor ou o pior da escola. Dedicou-se, porém, a fôlego curto, dispersando-se entre desejos desencontrados. Aos dezoito anos entrou para faculdade. Longe dos olhos dos pais, vivendo agora numa república de estudantes, deixou romperem-se os últimos fios que enrolavam-se às asas de seus sonhos de vida livre e aventurosa, embora não abrisse mão dos recursos que lhe enviavam  os pais.
          Passados os primeiros tempos de aulas intermitentes, abraçou-se a uma depressão fina e aguda que lhe trocou os olhos claros e vivos por outros abstratos e curtos, tímidos, que não ousavam estender-se senão aos copos de cerveja e a outras companheiras mais quentes que pediam cigarros e mais cigarros, indo dai a dar serviço aos médicos por um longo tempo, sonso e taciturno.
          Posto de lado o jornalismo, passou a cursar direito, que durou pouco. Deste foi ao teatro, para logo o largar, quando passou num concurso público que deixou apenas se achou nele empossado.
          De quando em quando ia ver os pais. Beijava a mãe, abraçava o velho e obtinha deste algum dinheiro que dissipava logo. Depois trabalhou, amou e desamou a homens e mulheres guardando sempre uma imagem longínqua do que se passava, junto de uma saudade triste e lenta e partia levando sempre a mesma insatisfação diluída em afazeres vagos e imprecisos, monótonos como o cinza imenso que derramava-se pelos céus, nos dias de ventos frios que lhe cortavam a pele.
          Aos vinte e cinco anos, entrou pelo caminho de uma seita; depois a trocou por outra; que foi substituída pela seguinte; que teve também sua sucessora; até que encontrou a única, a definitiva, sua porta aberta sob feixe de luz pela qual entrou de cabeça ereta e busto soberbo.
         Depois de uns meses, vestido num manto especial, ingressou no grupo de missionários e foi à Amazônia salvar alguns índios. Logo na chegada, desgarrou-se de seu pequeno grupo e entrou pela mata densa. Nas buscas contínuas, seguiram seus passos e refizeram o caminho pelo qual se embrenhara, chamando alto pelo seu nome, que ecoava forte, repartindo-se por espaços longínquos, até perder-se, de todo, entre as árvores frondosas e infinitas, deixando no ar, até hoje, o vazio do desconhecimento de seu destino.
Elói Alves
do livro Contos humanos




Os ratos e os reis do Brasil
http://realcomarte.blogspot.com.br/2013/08/os-ratos-e-os-reis-do-brasil.html

5 comentários:

  1. Vi aí retratado grande maioria de jovens que buscam alçar voo sem abrir mão da provisão de seus pais! às tontas são tantos, meu amigo, perdidos também, quer na amazônia ou no na selva de pedra!
    Parabéns...aguardo ansiosa por mais notícias do jovem!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Gratíssimo, Ira! De acordo contigo, parece mesmo que é um personagem que representa muitos; bjos gratos, amiga!

      Excluir
  2. Cada vez mais você me instiga,me intriga,me fascina com seus textos.De início achei o título sugestivo demais ,mas melhor é pensar que qualquer semelhança terá sido mera coincidência;Dizem que a ficçao imita a vida real,vejo quantos "Homilianos"estão por aí vivendo em busca do ideal(?),quer seja no campo profissional,espiritual...alguns entram pra história com alguns feitos realizados,conquistados outros no anonimato ficam,mas buscaram...Você é demais,Elói!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Muito grato, querida Marilene, por sua gentil leitura e por seu comentário; abraços grato!

      Excluir
  3. Leonice Rocha Tadinho (pelo face) totalmente perdido,sem nenhuma sabedoria e aparentemente carente de uma boa filosofia de vida,a escuridão fundamental na vida obstrui a visão do caminho correto de se viver ,senti compaixão por Pedro Homiliano Eloi ,parabens meu amigo sempre tocando os coraçoes de seus leitores!! Boa noite e obrigada por compartilhar adorei !! bjs

    ResponderExcluir

Postagens populares (letrófilo 2 anos 22/6)